Como evitar prejuízos jurídicos em contratações públicas: lições práticas do TCU, AGU e TCE

Descubra como empresas e gestores públicos podem evitar riscos e prejuízos em licitações e contratos administrativos.


Você sabia que mesmo executando corretamente um contrato público, sua empresa pode ser condenada a devolver valores ao erário por superfaturamento? Pois é, isso acontece quando a proposta apresentada, embora pareça vantajosa, ultrapassa os preços médios de mercado — e esse tipo de falha pode levar à responsabilidade solidária da empresa. É exatamente isso que decidiu o Tribunal de Contas da União (TCU), no emblemático Acórdão 1084/2025.

Ao mesmo tempo, em um Brasil repleto de emergências, imprevistos e falhas administrativas, não são raras as vezes em que a Administração Pública contrata sem a devida formalização legal. Mas como regularizar essas situações sem ferir os princípios da legalidade e da moralidade? A resposta está no recente Parecer Referencial nº 00003/2025 da AGU/CGU, que oferece caminhos viáveis — embora rigorosos — para lidar com essas exceções.

Esse artigo mergulha em decisões recentes do TCU, da AGU, da CGU e dos Tribunais de Contas estaduais para esclarecer como empresas, gestores e operadores do Direito podem atuar com segurança e evitar prejuízos. Prepare-se para conhecer interpretações inovadoras, riscos ocultos e as boas práticas jurídicas que estão moldando o novo cenário das contratações públicas no Brasil.


A responsabilidade solidária no superfaturamento de ,

O TCU deixou claro no Acórdão 1084/2025 que apresentar a proposta mais barata não é suficiente para afastar a hipótese de sobrepreço. A Administração deve comparar os preços apresentados com os praticados em outros órgãos, principalmente em serviços comuns como digitalização, guarda e certificação digital de documentos.

O que muda na prática?

  • A pesquisa de preços deve ser ampla e criteriosa, buscando contratos semelhantes em escopo e condições;
  • Empresas devem avaliar se os preços do edital estão realmente alinhados ao mercado;
  • A execução correta do contrato não exclui a devolução dos valores recebidos acima do justo — o dano ao erário já está configurado.

Ou seja, a simples aderência ao edital não é um salvo-conduto para a empresa. Responsabilidade solidária significa que tanto o gestor público quanto a empresa contratada respondem pelo dano ao erário.


Contratações sem cobertura contratual: é possível pagar?

A Administração Pública, em certas situações, contrata informalmente e depois se vê em um impasse: o serviço foi prestado, mas não há contrato. Pode-se pagar mesmo assim?

A resposta é sim — mas com uma série de exigências. O Parecer Referencial 0003/2025, da AGU/CGU, estabelece que o pagamento pode ser feito desde que:

  • A situação tenha sido urgente ou excepcional;
  • Haja boa-fé da Administração e do fornecedor;
  • O serviço tenha sido de fato prestado;
  • O valor seja compatível com o mercado;
  • E existam recursos orçamentários disponíveis.

O que é dispensado?

Surpreendentemente, não é necessária a regularidade fiscal e trabalhista do fornecedor, especificamente nesse caso. Isso representa uma mudança relevante, pois elimina um dos principais entraves ao pagamento.

Contudo, é essencial destacar: essa regularização é excepcionalíssima e não deve ser banalizada. Além disso, o gestor responsável ainda pode ser investigado e responsabilizado.


Serviços intelectuais e o mito da inexigibilidade automática

Outro ponto de destaque está nos chamados serviços técnicos especializados de natureza predominantemente intelectual. Existe um equívoco comum de que tais serviços devem sempre ser contratados por inexigibilidade, nos termos do art. 74 da Lei 14.133/2021.

Mas cuidado: quando o valor da contratação ultrapassa R$ 300.000,00, serviços como:

  • Estudos técnicos;
  • Projetos básicos e executivos;
  • Fiscalização de obras;
  • Análises laboratoriais e ambientais,

devem obrigatoriamente seguir o rito da concorrência, com julgamento por melhor técnica ou técnica e preço, conforme determina o art. 37, II, da mesma lei.

Isso representa um marco interpretativo relevante, que exige atenção especial de quem atua com licitações públicas na área de engenharia, meio ambiente e projetos estruturantes.


Fundações de apoio e a nova Portaria AGU nº 275/2025

A nova Portaria AGU nº 275/2025 trouxe atualizações importantes sobre contratações diretas com fundações de apoio. De acordo com o normativo, os contratos firmados com base no art. 24, XIII, da Lei 8.666/1993 (ou art. 75, XV da Lei 14.133/2021):

  • Devem ter projeto específico, com objeto e prazo definidos;
  • É vedada a subcontratação;
  • É proibida a contratação de serviços contínuos ou permanentes;
  • Não podem atender necessidades permanentes da Administração.

Com isso, a AGU reforça a natureza transitória e vinculada dessas contratações, evitando o uso indevido desse instrumento como meio de terceirização informal e permanente.


Microempresas podem firmar contratos milionários? Sim!

Essa dúvida ainda assombra muitos gestores e empresários: uma microempresa pode ganhar uma licitação de R$ 10 milhões?

Segundo o TCE-ES, sim. A decisão firmada no Acórdão TC-293/2025 deixa claro que o valor do contrato não impede a participação da empresa, desde que, no momento da licitação, ela esteja corretamente enquadrada como ME ou EPP.

Aspectos relevantes da decisão:

  • O limite de faturamento previsto na Lei Complementar 123/2006 é critério de classificação, não de limitação de contratos;
  • A empresa é responsável por monitorar seu enquadramento;
  • Os benefícios da LC 123/2006 (preferência, regularização fiscal tardia, etc.) continuam válidos, mesmo em contratos de alto valor.

Portanto, gestores públicos e comissões de licitação devem estar atentos a esse ponto para não cometer ilegalidades ou discriminações indevidas.

As recentes manifestações do TCU, da AGU/CGU e dos Tribunais de Contas estaduais revelam uma preocupação crescente com a segurança jurídica, a responsabilidade fiscal e o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos administrativos.

Seja na forma de prevenção ao superfaturamento, de regularização excepcional de despesas, ou mesmo no correto enquadramento de ME/EPP, essas decisões e pareceres oferecem guias práticos e realistas para que gestores públicos e fornecedores atuem com mais segurança jurídica e transparência.

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